Errar é humano, mas correção tem de ser ágil e transparente – 31/05/2025 – Alexandra Moraes – Ombudsman

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O reconhecimento do erro e a sua correção são obrigações que o jornal tem em qualquer plataforma. E é óbvio que o ideal é não haver erro, mas aqui tratamos do leite derramado.

Fazer essa correção de forma clara e ágil é um dos alicerces do compromisso com os leitores, e a disposição para a transparência nesse processo é um ponto positivo da Folha. Colocá-la em prática, porém, são outros quinhentos.

O jornal demorou demais a corrigir um texto que apresentava um dado escandaloso (e errado): o de que 40% das mulheres assassinadas no Brasil seriam evangélicas. O artigo de opinião atribuía erroneamente o índice a um documento do Fórum Brasileira de Segurança Pública.

Mas o que o relatório “Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil” mostrava era que “42,7% das mulheres que se identificaram como evangélicas sofreram violência por parceiro íntimo ou ex-parceiro íntimo”. Também informava que o índice entre católicas era de 35,1%.

O erro poderia ter sido evitado com rechecagem. Mas, já no ar, deveria ter sido corrigido rapidamente. A escolha, porém, foi por adicionar outra fonte que supostamente endossava o dado dos assassinatos, sem reconhecimento claro do erro anterior nem checagem suficiente. Isso originou mais um equívoco: a nova fonte tampouco corroborava a ideia que era destacada no título. Apenas numa terceira rodada houve correção dos dados e do enunciado, transformado em “Por que 40% das mulheres evangélicas são vítimas de violência?”.

A trapalhada foi acompanhada e documentada por um usuário do X, ex-Twitter, o engenheiro Franklin Weise. “Gosto de checar e ver as fontes, os métodos”, diz Weise, co-idealizador do site desvendados.com. “Espero que o tom de minha postagem tenha sido de crítica construtiva. Algo raro no Twitter, eu sei.”

Um dos leitores que escreveram à ombudsman sobre o caso destaca como maior problema “a inércia da Folha em corrigir” o erro. “Afinal de contas, o compromisso primeiro do jornal deveria ser com a informação.”

O teólogo e pastor batista Yago Martins identificou no descaso um viés. “Se a notícia fosse: ‘40% das esposas negras são assassinadas pelo marido negro’, a quantidade de críticas na matéria seria maior que a própria notícia. Mas como o título e o texto dizem que esposas evangélicas são mais assassinadas pelos maridos e ainda tenta explicar isso teologicamente, como se fosse culpa de um tipo de leitura bíblica, passa sem questionamento.”

Autora do texto, a psicanalista e teóloga Karin Kepler Wondracek diz que houve erro seu na interpretação dos dados. Depois, “como outras pesquisas davam resultados parecidos, a esperança de encontrar confirmação era grande. Mas não encontrei”, diz Wondracek. “Lamento o ocorrido e penso que esse erro desviou a atenção do texto em si –que era o mais importante: que o ensino patriarcal, que é parcial e não é o original cristão, incita a violência contra as mulheres.”

Sejam autores ocasionais ou colunistas regulares, os colaboradores externos estão sujeitos às regras do Manual da Redação, mas cabe ao jornal aplicá-las no processo de edição. E o Manual é claro: “Providencie a correção sem hesitação nem subterfúgios. A rapidez é ainda mais necessária no plano digital, para minimizar danos decorrentes da sua propagação. Demorar a reconhecer um equívoco revela descompromisso com a exatidão”.

Sites que reproduzem conteúdo da Folha nem sempre têm mecanismos de correção, portanto os erros continuam rodando por aí. Para piorar, agora o problema também pode ir parar em ferramentas de inteligência artificial.

Mas há casos de erros que a Redação, em vez de tirar, coloca em textos de colunistas.

Isso aconteceu em outro conteúdo recente sobre evangélicos. Jornalistas da Redação normalmente recebem os textos de colunistas e os transferem para o sistema de publicação da Folha, além de providenciarem fotos e ilustrações.

Foi assim que uma foto do pastor Cláudio Duarte, um dos mais conhecidos nomes evangélicos no Brasil, virou ilustração de texto do colunista Juliano Spyer sobre pastores gays. Mas Duarte, ligado ao bolsonarismo, não tinha associação direta com o tema da coluna.

O colunista usou seu espaço nesta semana para se desculpar por um erro que não era seu, e sim do jornal. “O pastor Cláudio Duarte é muito conhecido no meio em que atuo, por isso julguei necessário”, diz Spyer.

Apesar de a foto ter sido mudada, apenas depois do pedido de desculpas do colunista houve publicação do Erramos. “Tenho certeza de que não foi erro proposital nem para atacar o pastor”, declara o colunista. “Mas reflete ignorância em relação ao assunto.”

Sobre os casos, o secretário de Redação Vinicius Mota diz que “houve falha de procedimento”. “A regra é corrigir os erros com rapidez e total transparência.”


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