Eduardo Sombini
Arlene Clemesha é uma das mais conhecidas vozes críticas à ofensiva militar de Israel em Gaza e, de forma mais geral, ao sionismo, a ideologia política de defesa do Estado judeu no Oriente Médio.
Em “Marxismo e Judaísmo: História de uma Relação Difícil” (Boitempo), o foco da sua análise, no entanto, é outro: a historiadora se volta a como movimentos marxistas e socialistas lidaram com a questão judaica até as vésperas da Primeira Guerra Mundial, período em que o antissemitismo tinha feições diferentes e o sionismo, menos força.
Na conclusão da obra, Clemesha diz que a relação com o judaísmo foi a mais cheia de contradições e dificuldades com que o marxismo se deparou, mas que foi essa a teoria social que se ocupou mais seriamente das condições de emancipação dos judeus.
O trabalho é resultado da sua dissertação de mestrado, defendida em 1998, e ganha agora uma nova edição, com dois novos capítulos e um novo prefácio. Hoje, a autora é professora de história árabe da USP e diretora do Centro de Estudos Palestinos da universidade.
Na entrevista, Clemesha fala sobre as transformações do antissemitismo nos séculos 19 e 20 e defende que a necessária condenação desse tipo de preconceito não deve ser usada para silenciar críticos de Israel.
O antissemitismo ainda existe e ainda pode aflorar, porque as suas raízes estão, infelizmente, ali. Não foram combatidas suficientemente à medida que o antissemitismo é um racismo, e o racismo existe de diversas formas. É verdade também que, à medida que o Estado de Israel implementa uma série de políticas absolutamente contrárias aos palestinos, causando angústia e raiva, há um transbordamento. É possível perceber que, em certos grupos, existe uma tendência que a crítica ao Estado de Israel transborde para um sentimento contra judeus, à medida que o Estado de Israel se coloca como representante de todos os judeus do mundo, o que nem todos os judeus do mundo aceitam
A pesquisadora diz considerar que o país está cometendo um genocídio de palestinos na Faixa de Gaza e explica por que pensa que a solução de um só Estado, que una israelenses e palestinos, pode até ser o caminho mais simples para a paz na região —lembrando que, hoje, qualquer proposta parece completamente irrealizável.
Israel nega as acusações de genocídio contra palestinos. Em defesa na Corte Internacional de Justiça, o país declarou que uma guerra trágica está em curso na Faixa de Gaza, não um genocídio, e que acusar Israel desse crime é uma leitura distorcida do direito internacional.
Juízes da Corte analisam uma denúncia da África do Sul, que acusa Israel de descumprir, em Gaza, a Convenção Internacional contra o Genocídio.
O Tribunal Penal Internacional emitiu em novembro de 2024 mandados de prisão contra o premiê de Israel, Binyamin Netanyahu, o ex-ministro da Defesa do país Yoav Gallant e o comandante do Hamas Mohammed Deif por crimes de guerra. À época, o gabinete de Netanyahu chamou a decisão de antissemita e disse que as acusações são absurdas e falsas.
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Já participaram do Ilustríssima Conversa Sérgio Costa, pesquisador das desigualdades do Brasil, Lenin Bicudo, para quem a insatisfação com a medicina tradicional impulsiona a crença na homeopatia, Juliana Dal Piva, jornalista que escreveu sobre o assassinato de Rubens Paiva, Marta Góes e Tato Coutinho, autores de biografia do físico Cesar Lattes, Rafael Alves Lima, que discutiu o boom da psicanálise durante a ditadura militar, Ernesto Rodrigues, autor de trilogia sobre a história da Globo, André Roncaglia, para quem o agronegócio e bets estão transformando a economia brasileira em “fazendão com cassino”, Tiago Rogero, criador do projeto Querino, Jessé Souza, autor de livro sobre o voto de eleitores pobres, Ronilso Pacheco, teólogo que analisa o uso da gramática religiosa pela extrema direita, entre outros convidados.
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