Hélio Schwartsman
Minha simpatia por teorias do direito penal mínimo faz com que eu não seja o maior fã de penas de prisão. Sou, contudo, um defensor ardoroso de condenações. Autores de crimes graves precisam ser condenados especificamente pelos delitos que cometeram (o tipo e o tamanho da sanção são uma outra discussão), ou os efeitos dissuasórios do direito penal não se materializam.
Gosto de citar uma frase do cardeal de Richelieu que captura a essência do problema: “Fazer uma lei e não a mandar executar é autorizar a coisa que se quer proibir”. Se parlamentares tiverem sucesso em aprovar uma anistia para os golpistas de 2022-23, estarão convidando futuros usurpadores a agir sempre que desgostarem dos resultados das urnas. Caberá à Justiça Eleitoral só organizar a fila das intentonas, a fim de que não ocorram duas ao mesmo tempo.
E a desmoralização da recente Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito (que entrou em vigor em 2021 para substituir a famigerada Lei de Segurança Nacional e foi ironicamente sancionada com as assinaturas de Jair Bolsonaro e dois de seus corréus) não seria o único efeito adverso da anistia.
O perdão seria contestado na Justiça e é enorme a probabilidade de o STF considerá-lo inconstitucional, o que colocaria o país à beira de uma crise entre Poderes, com Legislativo e Judiciário disputando para ver quem tem a última palavra.
Crises institucionais não são piores do que golpes, mas são bem ruins. O novo presidente da Câmara, Hugo Motta, fará bem se, valendo-se de suas prerrogativas legais de controle sobre a pauta, conseguir evitar que o Congresso pule nesse precipício.
Não duvido de que os deputados bolsonaristas estejam sendo pressionados por suas bases para aprovar a anistia, mas o quadro nacional é inteiramente outro. Como mostrou o Datafolha, 56% dos brasileiros são contra o perdão; os favoráveis são mais modestos 37%. Em relação especificamente a Bolsonaro, 52% acham que ele deveria ser preso.
Motta tem respaldo se quiser defender a democracia.
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