O musical “Chatô e os Diários Associados” chega aos palcos como uma viagem no tempo pela história da comunicação brasileira. A história começa com Fabiano (Claudio Lins), um jornalista desiludido que, ao encontrar a estátua de Assis Chateaubriand em Recife, é transportado para momentos decisivos da mídia nacional. Assim, o espetáculo alterna entre dois tempos: o passado grandioso de Chatô — interpretado pelo ator Stepan Nercessian —, com a criação da revista O Cruzeiro e a TV Tupi, e o presente difícil de Fabiano e sua namorada Juliana (Patrícia França), repórteres enfrentando a crise do jornalismo atual.
O grande trunfo do musical está nesse contraste entre épocas. Enquanto as cenas históricas mostram o força e a ambição de Chatô em construir seu império midiático, a trama contemporânea revela como a profissão jornalística perdeu prestígio e estabilidade. As canções — que vão do samba a ritmos modernos — ajudam a costurar esses dois mundos, celebrando tanto a era de ouro da comunicação quanto questionando seu futuro.
O espetáculo não cai na armadilha de endeusar Chatô, figura conhecida por seu autoritarismo. Em vez disso, mostra suas contradições: um visionário que revolucionou a mídia, mas também um homem sedento por notoriedade. Essa complexidade se reflete na jornada de Fabiano, que redescobre seu amor pelo jornalismo ao entender que, apesar de todas as mudanças, a busca por boas histórias permanece essencial.
O relacionamento entre Fabiano e Juliana dá o tom emocional à narrativa. Seus conflitos profissionais — entre o idealismo e a necessidade de se adaptar aos novos tempos — ecoam os dilemas de toda uma geração de jornalistas. Quando Juliana questiona se ainda vale a pena lutar pela profissão, a peça parece perguntar: o que restou do legado de Chatô em tempos de redes sociais e fake news?
“Chatô e os Diários Associados” é um retrato honesto sobre paixão e frustração no jornalismo. Mostra que, se por um lado a comunicação mudou radicalmente, por outro, desafios como ética, credibilidade e influência da mídia continuam atuais.
Três perguntas para…
… Stepan Nercessian
Quais foram os maiores desafios em representar Chatô, considerando seu legado complexo na comunicação brasileira?
O primeiro grande desafio foi decorar o texto todo. Além de escrever, Chatô falava bastante também. O segundo é que apesar de quase contemporâneo, não existe muito material que pudesse fazer o desenho físico do personagem. Quase não ouvi sua voz. Depois resolvi que o meu Chateaubriand seria o que a emoção ditasse.
O personagem é polêmico, contraditório. Mas o enredo da peça diz que ele quer mostrar o lado pouco conhecido dele. O lado da paixão. Antes de mais nada, Chatô era um apaixonado pelo mundo da notícia, da imprensa e da comunicação. Não julgo meus personagens. Eu mostro e o público decide e tira suas conclusões.
O musical mistura momentos históricos com uma história contemporânea. Como você vê essa fusão de tempos e narrativas?
O musical é lindo, bem cantado, bem dançado, bem tocado e muito bem dirigido. Cenários e figurinos caprichados, e tudo junto ajuda a contar a história. É uma viagem no tempo.
O espetáculo também discute os desafios do jornalismo hoje. Que paralelo você vê entre a era de Chatô e a mídia atual?
Tecnologicamente tudo mudou e mudou sensivelmente. Mas algumas coisas ainda permanecem. A relação da imprensa com governos e com empresas, por exemplo, continua instigando nossa imaginação. Até onde a imprensa pode se considerar livre e independente? O que era boato virou fake news. As redes sociais poluíram o papel da imprensa profissional. A imprensa seria ainda o quarto poder?
São perguntas para as quais não conheço ainda respostas precisas e nítidas. Mas o que enxergo é muita gente que exerce a profissão de jornalista com a mesma paixão que Chateaubriand tinha pela comunicação.
Teatro João Caetano – praça Tiradentes, s/n – Centro, Rio de Janeiro. Sex. e sáb., 19h. Dom., 17h. Até 27 de abril. Duração: 2h20. A partir de R$ 20 em funarj.eleventickets.com
Grande Teatro Sesc Palladium – rua Rio de Janeiro, 1.046 | av. Augusto de Lima, 420 – Centro, Belo Horizonte. Sáb., 15h e 20h. Dom., 18h. De 31/5 a 1º/6. A partir de R$ 25 em sympla.com.br
Teatro Liberdade – rua São Joaquim, 129 – Liberdade, São Paulo. Sex. e dom., 20h. Sáb., 16h e 20h30. De 27/6 a 17/8. A partir de R$ 25 em sympla.com.br
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