Danielle Brant
Um processo para contratar consultores de um projeto que busca capacitar secretarias do Ministério da Igualdade Racial selecionou pessoas próximas à ministra Anielle Franco, entre elas uma amiga e madrinha de casamento e uma ex-coordenadora do Instituto Marielle Franco.
O projeto “Gente Negra Reconstrução e Desenvolvimento” é resultado de um convênio de cooperação técnica entre o Ministério da Igualdade Racial e o CAF (banco de desenvolvimento da América Latina e Caribe).
Foram abertas seis vagas, sendo uma de coordenador e cinco de consultorias temáticas, com orçamento bancado pela CAF.
O posto de coordenação tem como objetivo monitorar a execução global do projeto, fazendo um plano de trabalho e acompanhando as atividades desenvolvidas pelos demais consultores contratados. O orçamento para esse cargo é de US$ 66 mil (cerca de R$ 342 mil) por uma consultoria de 12 meses.
Para a vaga de coordenadora foi selecionada, em maio de 2024, a jornalista e professora Bianca Santana, como antecipou o site Antagonista. Colunista da Folha, ela foi madrinha de casamento da ministra, em cerimônia realizada dois meses depois, em julho do ano passado.
Já a sanitarista Fabiana Pinto Fernandes foi contratada para a vaga de consultor componente 3: “Agenda de combate a fome e pobreza com equidade de gênero e raça”. O orçamento é de US$ 44.928 (R$ 256,5 mil) por um período de dez meses.
Fabiana, também selecionada em maio do ano passado, atuou de fevereiro de 2022 a abril de 2024 como coordenadora de Incidência e Pesquisa do Instituto Marielle Franco. Antes, de maio de 2020 a fevereiro de 2022, foi pesquisadora na mesma entidade. A organização, fundada por Anielle, foi criada após o assassinato de sua irmã, a vereadora Marielle Franco, em março de 2018.
Em redes sociais, ela aparece ao lado da ministra em diversas fotos, e a chama de amiga.
No caso da vaga de componente 1: Promoção da Igualdade Racial, houve um novo processo seletivo. O orçamento é de US$ 44.928 (R$ 256,5 mil) para uma consultoria de dez meses. Em maio de 2024, a selecionada havia sido a pesquisadora Cecilia Maria Izidoro Pinto, coordenadora do Ori, Grupo de Estudo e Pesquisas em Raça, Gênero e Sexualidade.
O núcleo de pesquisa tem ligação com o Programa Interdisciplinar de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Em seu site, o Ori traz como uma de suas pesquisadoras a ministra Anielle.
Em julho, no entanto, a inscrição para a vaga foi reaberta e, no mês seguinte, foi contratada Jaqueline Lima Santos.
Já Alex da Mata Barros foi contratado para a vaga de consultor componente 5: Dados e Estudos para Plano Nacional Esporte sem Racismo. O orçamento é de US$ 44.928 (R$ 256,5 mil) para uma consultoria de dez meses.
Barros teria sido indicado pela ministra para um cargo na Prefeitura de Maricá, segundo o atual prefeito, Washington Quaquá (PT). Na cidade fluminense, seria funcionário fantasma, segundo divulgado pelo portal Metrópoles. Quaquá e Anielle já protagonizaram um embate público após ele postar uma foto com a esposa e os filhos de Domingos Brazão, apontado como mandante do assassinato de Marielle.
Outro lado
O ministério diz que a Consultoria Gente Negra é oferecida pelo banco CAF, em apoio ao fortalecimento institucional do Ministério da Igualdade Racial.
“O edital de seleção foi elaborado seguindo os critérios e padrões internacionais informados pelo banco”, diz a pasta.
Segundo a assessoria da pasta, o chamamento para o convênio foi “devidamente divulgado pelo site do Ministério da Igualdade Racial para conhecimento público e foram analisados currículos e propostas de candidatos que se inscreveram”.
“Os selecionados têm experiência e capacidade técnica compatíveis com o cargo e prestam serviços conforme suas expertises e currículos”, acrescenta.
O Painel procurou a CAF, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.
Bianca Santana afirma ter concorrido em um edital público e que seu currículo e contratos de sua empresa resultaram na sua seleção. “Desde 2007, sou consultora de órgãos públicos e privados”
Ela fiz ainda que o CAF “faz suas escolhas a partir de critérios objetivos, em diálogo com o Ministério da Igualdade Racial, não com a ministra.”
“Como não tenho outro contrato em andamento com a CAF, não sou parente da ministra, nem por consanguinidade, nem por afinidade, não havia nenhum impedimento para que eu participasse do processo seletivo. Nem amiga nem madrinha de casamento são graus de parentesco”, acrescenta.
Fabiana Pinto Fernandes diz ter “mais de sete anos de experiência na formulação, implementação e articulação de políticas públicas, com atuação direta na mobilização de grupos sociais, especialmente no que diz respeito à pauta de equidade racial e de gênero”.
Diz que integrar o grupo Mulheres Negras Decidem “proporciona um amplo contato com redes de mulheres negras em diferentes regiões do país.”
Ela afirma ainda ter sido selecionada como consultora e contratada pela CAF. “Em nenhum momento entrei em contato, nem fui acionada pela ministra, já não fazendo mais parte da organização em que trabalhei com ela há quase 1 ano, e não tendo contato profissional com a mesma desde janeiro de 2023, quando ela deixou a organização para assumir o ministério”, diz.
Procurada, Cecília Pinto não respondeu ao Painel.