Guiou terreiro de candomblé no Recôncavo Baiano – 16/04/2025 – Cotidiano

Date:

Compartilhe:

Adriano Alves

Quem chegava ao Terreiro Raiz de Ayrá, em São Félix (BA), percebia logo o capricho da dona da casa. A mãe de santo Mariah Kesi era perfeccionista e vaidosa, gostava de tudo impecável. Todo dia varria o quintal três ou quatro vezes, não deixava uma folha caída no chão.

Sua vida foi dedicada à fé e à orientação espiritual de muitos que procuravam seu colo. Tornou-se uma defensora do patrimônio cultural afro-brasileiro no Recôncavo da Bahia e teve seu terreiro registrado como patrimônio imaterial do estado em 2014. Fez parte da Federação Nacional do Culto Afro-Brasileiro e contribuiu para a organização do candomblé em vários estados.

A iyalaxé se orgulhava de nunca ter precisado de filho de santo para colocar nada em seu terreiro, mas suas exigências também acabaram por afastar alguns. “Era uma pessoa muito durona. Muitos achavam insensível, mas quem conviveu sabe que ela era muito carinhosa, da forma dela”, afirma seu filho de santo Tacun Lecy, 47, a quem ela passou as obrigações da casa ao dar-lhe o cargo de babalaxé.

Mariah Ferreira dos Santos nasceu em São Félix (BA), em 1934. Teve uma infância difícil. Eram nove irmãos em uma família pobre. Mas dentro de casa recebia muito carinho, contava que sempre foi a preferida dos pais. Nunca apanhou nem ficou de castigo, o que, segundo ela, a fez crescer com “o topete lá em cima”.

Foi a estudiosa da família. Chegou a iniciar o curso de farmácia na Universidade Federal da Bahia (UFBA), mas desistiu quando viu sangue, tinha pavor.

Criada em família católica, integrava a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição da Praia em Salvador.

Seu primeiro contato com o candomblé foi em busca de explicações para problemas de saúde que os médicos não conseguiam diagnosticar. Tomava remédios e as dores não passavam, até que sua mãe indicou ir até a yalorixá Mundinha. Tomou banho de folhas e melhorou.

Foi iniciada na religião em 1959 por pai João Balbino dos Santos. À época, o Terreiro Raiz de Ayrá estava sediado em Salvador. Quando o babalorixá foi para o Rio de Janeiro, ela e um irmão de casa ficaram de apoio a Mundinha. Após a morte da líder religiosa, Mariah recebeu o cargo de iyalaxé. Um ano depois, levou o terreiro de volta para a cidade onde foi criado, São Félix.

Durante a vida, Mariah foi uma mulher independente, que gostava de decidir como viver. Teve carreira de funcionária pública, lotada no INSS. Casou-se com Davi Santiago, que era funcionário da Petrobras, e ficou viúva em 1989.

Também atuou no grupo de baianas da extinta Bahiatursa (Empresa de Turismo da Bahia S.A.). Elas viajavam para divulgar a cultura local em outros estados e países. Mariah contava que certa vez ficou hospedada no mesmo hotel que Pelé.

Há mais de 30 anos teve um câncer e retirou uma das mamas. Todo ano fazia o preventivo, mas passou a ter problemas de saúde em dezembro. Morreu no dia 28 de março, aos 90 anos, após metástase.

Deixa seu terreiro e muitos filhos de santo.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

Veja os anúncios de mortes

Veja os anúncios de missa



Leia Mais: Folha

spot_img

Related articles

Tiroteios escolares mais mortais da Europa – DW – 06/10/2025

Um tiroteio na escola na cidade austríaca de Graz tem deixou pelo menos 10 pessoas mortasmarcando o...

‘Prisões em massa’ em Los Angeles, pois os manifestantes desafiam o toque de recolher

Os protestos sobre os ataques de imigração de Donald Trump continuaram na noite de terça -feira em...