Laryssa Borges
Com um Supremo Tribunal Federal (STF) conhecidamente refratário a Jair Bolsonaro, o ex-presidente e parlamentares aliados ao capitão foram orientados a desqualificar o acordo de delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid para tentar trincar a principal base da denúncia que colocou o ex-mandatário como líder de uma organização criminosa que planejou assassinar adversários políticos, anular o resultado legítimo de uma eleição e abolir o regime democrático no país. Nas palavras de um integrante da defesa de Bolsonaro, haverá “unidade de discurso” contra a colaboração de Cid.
Em um primeiro momento, as defesas preparam-se para explorar o vaivém de versões que Cid apresentou – com um fator adicional: em uma das audiências, o próprio ministro Alexandre de Moraes anunciou ao tenente-coronel que provas colhidas na investigação contradiziam os depoimentos anteriores do militar, que estaria dizendo “uma série de mentiras na colaboração premiada”.
Moraes disse ainda que, se a delação fosse revogada, os familiares do militar poderiam ser responsabilizados. “Democracia pujante e inabalável”, ironizou Bolsonaro após a revelação do teor da audiência entre seus dois algozes. Por elementos como estes, a colaboração premiada do ex-ajudante de ordens será a principal frente de batalha das defesas de Bolsonaro e cia até o julgamento da denúncia.
Os advogados também pretendem alegar que Mauro Cid foi pressionado a delatar e a mudar de versões para se adequar ao enredo da Polícia Federal e do Ministério Público. Em uma série de áudios revelados por VEJA, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro havia acusado a PF de ter distorcido suas declarações e garantira a um interlocutor que tampouco havia usado a palavra “golpe” ao acusar os delatados.
Nos primeiros depoimentos que prestou no acordo de colaboração, Cid ainda admitiu que tentara blindar o general Braga Netto, agora denunciado como responsável por planejar ações clandestinas contra a chapa presidencial eleita e financiar militares para execução do plano de sequestro e assassinato de Alexandre de Moraes. Somadas, as peças poderiam colocar em xeque o acordo de delação, acreditam as defesas.
Os advogados de Bolsonaro também pretendem se fiar na argumentação de que não existe nenhuma ordem verbal do ex-presidente para o golpe, nenhuma mensagem, nenhum áudio e nenhuma captação ambiental que o mostre defendendo um golpe de Estado ou insuflando as Forças Armadas a embarcarem na empreitada.
Devem utilizar ainda temas laterais da delação, como a falsificação de cartões de vacina, para desqualificar o enredo apresentado por Cid e pressionar pela anulação do acordo com a justiça. Se conseguirem comprovar que ele mentiu em um caso hoje considerado menor, como o da vacina, acreditam que semeariam suspeitas sobre a veracidade do que o delator disse em temas como o planejamento de um golpe que acabaria com a democracia no país.