Cristãos esperam que os papas morram para louvá-los – 26/04/2025 – Ricardo Araújo Pereira

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Em janeiro de 897, o papa Estêvão 6º organizou em Roma uma cerimônia que ficou conhecida como o Sínodo do Cadáver.

O que ele fez foi o seguinte: desenterrou o corpo do papa Formoso, cujo papado havia terminado com a sua morte, em abril de 896, e julgou o cadáver na basílica de são João de Latrão.

No julgamento, o papa Formoso foi acusado de vários crimes. O fato do cadáver ter ouvido todas as acusações em silêncio talvez tenha contribuído para reforçar a convicção de que era culpado, e acabou por ser essa a sentença do tribunal.

Estêvão 6º ordenou então que fossem cortados três dedos da mão direita do papa Formoso —os dedos usados para as bençãos—, e que o cadáver fosse sepultado num cemitério para estrangeiros.

Mais tarde, Estêvão 6º teve receios de que talvez tivesse sido muito benevolente, e por isso mandou desenterrar novamente o cadáver e atirá-lo ao rio Tibre.

Hoje, este procedimento nos parece terrível, e tudo menos cristão —e é provavelmente por isso que tanta gente faz agora o exato oposto. No tempo em que o papa Francisco era vivo, execraram a sua ação; depois de morto, foram feitos grandes elogios a ele.

Já não se desenterra um papa para criticá-lo. Devemos esperar para que seja enterrado para louvá-lo.

Durante a vida, o papa Francisco disse e fez umas coisas um pouco estranhas.

É natural, uma vez que Jesus Cristo disse e fez umas coisas um pouco estranhas. “Ama o teu inimigo”, por exemplo. Não há dúvida de que é esquisito.

Também fez umas considerações extravagantes acerca dos ricos. Qualquer coisa sobre ser muito difícil entrarem no reino dos céus, se bem me lembro.

O papa Francisco, provavelmente convencido de que ser cristão era seguir as palavras de Cristo, andou dizendo o mesmo, e se colocou ao lado dos pobres, dos doentes, dos imigrantes, e se tornou célebre a sua proposta de uma Igreja “para todos, todos, todos”.

Uma surpreendente quantidade de cristãos prefere, no entanto, uma Igreja só para alguns, alguns, alguns. E passaram o papado de Francisco a rosnar àquelas ideias excêntricas.

Enfim, o cristianismo é um pouco radical e não agrada a toda a gente. Especialmente, é curioso, a alguns cristãos.


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