André Barcinski
Edy Star, nome artístico de Edivaldo Souza, baiano de Juazeiro morto nesta quinta (24) aos 87 anos, foi um nome importante do pop rock do Brasil, um pioneiro da música de temática gay e participou de dois álbuns marcantes de nossa música, “Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta: Sessão das Dez”, lançado em 1971 e dividido com Raul Seixas, Miriam Batucada e Sérgio Sampaio, e “Sweet Edy”, de 1974, seu primeiro disco solo e, para muitos, o primeiro LP assumidamente gay do Brasil.
“Sweet Edy” trazia uma coleção de rocks, sambas e baladas sensuais. “Chega de brincadeira/ já estamos bem-entendidos/ concubinados, convencidos/ que para um bom entendido/ meia cantada basta”, cantava Edy em “Bem Entendido”, gíria usada na época para designar os gays.
Na capa, Edy aparecia de roupa de renda, peito nu, rosto maquiado, paetês negros nos ombros e botas brancas até o joelho, num visual que não devia nada à androginia de David Bowie, Marc Bolan e Gary Glitter, artistas ingleses que faziam sucesso tocando glam rock, um estilo andrógino e festeiro.
Edy foi amigo de Raul Seixas na Bahia, apesar de ser sete anos mais velho que o “maluco beleza”. Ambos frequentavam o Elvis Rock Club, fã-clube de Elvis Presley em Salvador. “As duas únicas carteiras que existem do Elvis Rock Club são a minha e a do Raul”, disse Edy em entrevista a este repórter, no livro “Pavões Misteriosos”.
“A do Raul está conservada nas mãos de Sylvio Passos [amigo e arquivista da obra de Raul], e a minha, porque eu tenho uma estranha mania de guardar tudo que tem meu nome, eu tenho pilhas de recortes de jornais pequenos, jornal, a data e a folha, eu tenho os recortes todos, programas de teatro, programas de filme, tudo.”
Edy saiu da Bahia no fim dos anos 1960 e chegou ao Rio de Janeiro, onde começou uma carreira na música e no teatro. Acabou na praça Mauá, cantando na então famosa Boate Cowboy.
“Eu fui lá conhecer e fiquei encantado, me preparei a vida toda para fazer teatro de revista, mas não existia mais o teatro de revista. O único lugar que tinha algo parecido era a praça Mauá, na Boate Cowboy. Não era bem teatro de revista, também não era bem um pornô, era uma chanchada, completamente contra a maré, porque a censura proibia tudo aquilo, não podia ter nu frontal, não podia ter piadas picantes com palavrão, não podia ter lesbianismo, e tudo isso tinha no show da Praça Mauá.”
Na Cowboy, Edy fez amizade com um cantor que depois se tornaria um astro, Sidney Magal. “Magal sempre foi uma pessoa maravilhosa e um homem educadíssimo. Nós éramos muito amigos. Saíamos da Praça Mauá correndo para cantar na Boate Erótica, em Copacabana.”
O show de Edy na Praça Mauá ganhou fama depois de uma peculiar menção ao espetáculo, publicada no jornal Pasquim pelo cartunista Jaguar. “No show tinha mulher pelada dançando, tinha cena de lesbianismo, tinha um anão nu correndo pela plateia. O Jaguar viu o show e escreveu no Pasquim que a piroca do anão arrastava no chão, era coisa que só se podia ver em Amsterdã, e as pessoas começaram a ir para a Praça Mauá, que se transformou em um point.”
No show, Edy cantava hits da época, como “Let the Sunshine In”, do musical “Hair”, e também fazia esquetes cômicas. Sentava no colo dos fregueses, batia na cara de um deles e cantava “Perfume de Gardênia”. “O lugar ia abaixo”, dizia.
A Som Livre apostava no sucesso de “Sweet Edy”, mas o LP foi um fracasso de vendas. “Era um disco tão diferente que não vingou”, disse o músico. “Não sei se era muito à frente, talvez o pessoal não estivesse preparado para aquilo. Tem gente que está descobrindo o disco hoje, acho isso incrível.”
Em 1992, Edy viajou à Espanha para um mês de férias e acabou ficando lá por 18 anos. “A situação estava muito ruim aqui no Brasil, as boates já não tinham mais conjuntos, eu estava ficando sem dinheiro”, afirmou.
“Eu cheguei para ficar um mês, e três dias depois estava trabalhando numa boate, fazendo a mesma coisa que eu fazia no Brasil. Nos oito primeiros anos eu estava completamente ilegal. Arrumei um empresário e ele me punha um mês em cada boate, para não dar pinta para a imigração.” De volta ao Brasil nos anos 2000, retomou a carreira musical com o álbum “Cabaré Star”, de 2017.
Durante a estadia na Europa, Edy foi diagnosticado com câncer na próstata. Fez o tratamento na Europa e sobreviveu. “Hoje eu penso assim: tudo é lucro. E eu continuo com os mesmos métodos de vida, chato, exigente, sem paciência para a falta de cultura, e nada me incomoda mais. Está fumando? Eu vou para outro lado.”



