Julia Chaib, Victor Lacombe
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, usou nesta terça-feira (4) o maior palco desde sua posse em 20 de janeiro para defender os principais aspectos da agenda radical que tem implementado, contestada dentro e fora do país.
Trump falou no plenário do Congresso americano, diante de uma plateia de parlamentares dos partidos Republicano e Democrata e em um discurso televisionado em horário nobre dos EUA. No discurso, o presidente defendeu a imposição de tarifas, citando o Brasil, exaltando seus cortes —que incluem demissões em massa—, sua política de imigração e a relação com nações estrangeiras.
Em fala que se assemelhou aos seus discursos de campanha, Trump iniciou dizendo que “a América está de volta”. “Em 43 dias, tivemos mais realizações do que a maioria dos presidentes acumula em quatro ou oito anos, e estamos só começando”, disse.
“Nosso espírito está de volta. Nosso orgulho está de volta. Nossa confiança está de volta. E o sonho americano está crescendo, maior e melhor do que antes. O sonho americano não tem limites”, disse Trump. Ele fez referência ao seu discurso de posse quando disse que os EUA estão numa nova era de ouro, voltando a pintar um país fraco sob Biden —o antecessor, aliás, voltou a ser alvo de ataques no discurso desta terça.
Mesmo com maioria republicana na Câmara e no Senado, a fala não passou incólume e foi alvo de protestos de deputados e senadores democratas —o deputado Al Green, do Texas, interrompeu a fala de Trump logo nos primeiros cinco minutos do discurso, gritando “você não tem mandato” ao presidente. Green foi ordenado a se retirar pelo presidente da Câmara, Mike Johnson —é a primeira vez que isso acontece em um discurso como esse.
“Mais uma vez, olho para os democratas na minha frente e vejo que não há nada que eu possa fazer que vá fazer com que eles sorriam ou aplaudam”, disse Trump logo depois. “É a quinta vez que estou aqui, e é sempre a mesma coisa. Posso curar a pior doença que existe, e essas pessoas aqui não vão bater palmas, não vão se levantar e me apoiar. É muito triste, e não deveria ser assim.”
Em outro ataque aos democratas, Trump disse que a oposição criou um país com “fronteiras abertas”. “Desde que tomei posse, meu governo lançou a repressão mais ampla na nossa fronteira, e rapidamente atingimos os números mais baixos de cruzamentos ilegais na história”, afirmou, defendendo sua medida que criou o chamado gold card, que vende permissões de residência nos EUA a pessoas dispostas a pagar milhões de dólares por isso.
Em determinado momento, Trump exaltou suas medidas contra a comunidade trans, dizendo que não permitirá mais que “homens compitam em esportes femininos” e que estabeleceu que só há dois gêneros: feminino e masculino.
Também agradeceu o bilionário Elon Musk e sua iniciativa de cortes de gastos radicais do governo federal, citando uma série de medidas de veracidade não comprovada, como supostas iniciativas de milhões de dólares que, por exemplo, “criavam ratos trans”, “empoderavam indígenas colombianos” e pagavam por circuncisões em países africanos.
“A época dos burocratas não eleitos acabou”, disse Trump. “Qualquer burocrata que resistir a essas mudanças será removido do seu posto.”
O presidente citou o Brasil junto da União Europeia, China, Índia, Canadá e México quando defendeu suas tarifas. “Onde quer que imponham tarifas contra nós, nós vamos impor tarifas contra eles. Onde quer que eles nos taxem, vamos taxá-los. Todos os países se aproveitaram de nós por muitos anos, mas isso não vai mais acontecer.”
Ao longo do discurso, os democratas ergueram placas que diziam “falso”, “Musk rouba”, e “salve o Medicaid”, o programa de seguro saúde do governo que é alvo dos republicanos há anos. As parlamentares democratas vestiram-se com roupas rosas ou roxas chamativas como forma de protesto a Trump, e muitos membros do partido permaneceram sentados quando o presidente chegou.
O vice-presidente J.D. Vance, que acumula a presidência do Senado, entrou antes do chefe. Ao ser anunciado no microfone, recebeu aplausos de republicanos. A maior parte dos democratas, porém, não se manifestou.
O bilionário Elon Musk chegou ao plenário por volta de 21h, bem antes da entrada de Trump e dos membros oficiais do gabinete presidencial —o dono do X não está à frente de nenhuma pasta, apesar de comandar o Doge.
Ele foi aplaudido por algumas poucas pessoas e não foi autorizado a ficar no piso inferior junto com os parlamentares e onde Trump falou. Ele ficou sentado perto de familiares do presidente, entre eles Donald Trump Jr.
Foi o primeiro discurso ao Congresso do segundo mandato de Donald Trump. Esta mensagem aos parlamentares é tradicionalmente feita pelos presidentes da República anualmente, sob o nome de discurso de Estado da União, mas desta vez não recebeu oficialmente essa alcunha —é tradição que presidentes recém-empossados só se refiram ao discurso anual dessa forma a partir do segundo ano do mandato.
Desde que assumiu a Casa Branca, Trump tomou uma série de medidas que visam ampliar o próprio poder, desmantelar instituições e bagunçar a relação com antigos aliados. Suas ações têm sido contestadas em tribunais americanos, que impediram algumas de ir adiante, mas muitas outras tem tido efeito profundo nos EUA e no mundo.